sábado, 3 de julho de 2010

Brasil Fora da Copa do Mundo: O Emocional Também Entra Em Campo


Este artigo não tem a intenção de criticar ninguém nem procurar culpados para crucificar. Pelo contrário, respeito e admiro o Dunga assim como todos os jogadores da seleção brasileira. Apenas pretendo chamar a atenção para um fato óbvio que, em minha opinião, tem sido negligenciado. Sou psicanalista e, dentro do consultório como fora dele, nunca vi tanta gente desequilibrada emocionalmente. Elas estão em toda parte: nos hospitais, nas empresas, nas repartições públicas, nas escolas e faculdades, nos condomínios, inclusive nos campos de futebol.

Sim, o time brasileiro não perdeu para a Holanda, mas para si mesmo. Enquanto estavam ganhando, os jogadores pareciam felizes e motivados. Quando a situação complicou, o nervosismo e o descontrole ficaram evidentes. Não basta saber que se é o melhor time do mundo, é preciso sentir que se é e agir como tal.

Em uma disputa, quando perdemos, quase sempre somos derrotados por nossos próprios medos, por nossas inseguranças e fragilidades e pela incapacidade emocional de lidar com a situação adversa.

Nossa sociedade treina e incentiva os indivíduos a alcançarem vitórias e conviverem com emoções agradáveis e positivas. A mídia procura fabricar “campeões” para ganhar dinheiro às suas custas e tentar esconder um elefante embaixo do tapete da sala, vendendo um conto de fadas, mas a verdade é que não existem heróis imaculados. Todos nós somos falhos. Negar nossos defeitos é negar aquilo que faz de nós humanos. Como diria Clarice Lispector: “Até cortar os defeitos pode ser perigoso. Nunca se sabe qual é o defeito que sustenta nosso edifício inteiro.” O verdadeiro herói é aquele que encontra sua força em sua maior fraqueza. É aquele que enfrenta dores e obstáculos e os supera. Sabe que não é perfeito e não se preocupa em sê-lo.

Parece que se esqueceram de nos ensinar a lidar com frustrações e dificuldades. Hoje, jovens ricos e entediados, sem limites e incapazes de encarar a realidade de fato como ela é, queimam um índio deitado na praça para se divertir. Adultos infelizes com seus trabalhos descontam sua raiva em brigas de trânsito. Casais separam-se, quando aparece o primeiro problema conjugal mais sério.

Não é à toa que o consumo do Prozac e de medicamentos afins têm crescido assustadoramente. Em um mundo, que demanda respostas fáceis e rápidas, procuramos nos livrar logo da dor que incomoda. Só que viver machuca mesmo e gera ansiedade. Não dá para viver a vida, evitando-a. Quem quer ser mais feliz e equilibrado, precisa aprender a tolerar e a conviver com uma gama mais ampla de experiências emocionais.

Sua vida muda, quando você se transforma. Quem não lida com suas dores e não reconhece os seus erros, não amadurece nem aprende. O Felipe Melo, em uma entrevista após o jogo, disse que só pisou no jogador holandês, mas que não teve a intenção de machucar. O que ele quis dizer com isto? Que ele podia pisar então, só não podia machucar? Parece o político que só colocou um pouquinho de dinheiro na cueca.

Creio também que os ídolos mudaram. Antigamente, a fama era o resultado da competência com a dedicação. As celebridades atuais vivem mais de aparência do que de talento e preparação. Por isso, os realities shows fazem tanto sucesso. Não consigo entender o porquê destas estrelas sem brilho próprio serem tão endeusadas e, ainda por cima, ganharem tanto dinheiro. Qual o bem gigantesco que elas fizeram em prol da humanidade? Viva o glamour e os egos inflados! E como ficam os milhões de brasileiros anônimos que acordam cedo para trabalhar todos os dias, que dão um duro danado para ganhar o pão de cada dia e que recebem um salário que mal dá para sustentar a família? Nós sabemos que os jogadores de futebol famosos ganham uma fortuna.

Hoje, tanto se fala em ecologia e em um planeta melhor no futuro. Este lugar só existirá, se as pessoas mudarem. A transformação começa dentro de casa. Vamos criar seres humanos mais carinhosos e solidários, que saibam distinguir o certo do errado, que suportem frustrações, que aceitem regras e limites, que respeitem as diferenças, que não confundam posicionamento com agressividade, que dêem mais valor às pessoas do que ao dinheiro e ao “status”.

Espero que, em 2014, nossa seleção querida seja campeã e que, se não o for, pelo menos seja representante de uma população mais amadurecida, honesta e equilibrada, mantendo sua alegria e sua ginga brasileira inconfundíveis. Que venha o hexa!



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